Resumo
Lesões músculo-articulares, bem como a resposta inflamatória associada, estão entre as preocupações constantes desde o início dos programas espaciais. No espaço, os estímulos mecano-esqueléticos e vestíbulo-neuromusculares, se encontram abaixo do limiar fisiológico, o que resulta na atrofia muscular e óssea, além de problemas no equilíbrio e coordenação quando do retorno à Terra. Essas alterações acontecem de forma 10 vezes mais rápida quando comparado com o processo do envelhecimento. Estudos relatam que o descarregamento gravitacional por exposição à ausência de peso causa atrofia, principalmente em músculos antigravitacionais de contração lenta como o sóleo. No músculo, a microgravidade resulta em uma rápida redução no tamanho das fibras, combinada com alterações na expressão gênica que induzem um perfil bioquímico e contrátil mais rápido e mais glicolítico. Na cartilagem, altamente mecanoresponsiva, a descarga completa diminui a estabilidade articular levando à erosão tecidual, e ocasionando a osteoartrite (OA), que é uma das principais causas de incapacidade no mundo. A osteoartrite do joelho pode ser ocasionada pela degeneração meniscal. Nesse sentido, é necessário entender a resposta dos fibrocondrócitos meniscais (MFCs) e da sinalização pela matriz extracelular (MEC), incluindo a interação célula-matriz em condições de microgravidade. Concomitante a isso, estudos imunológicos realizados em astronautas, após a viagem espacial, revelaram diferenças importantes na imunidade, como quantidades e proporções de leucócitos circulantes alteradas, alterações funcionais em neutrófilos e concentrações aumentadas de citocinas plasmáticas. Em astronautas, já foi descrito um aumento no número de neutrófilos maior que 100% após um voo espacial, além de alterações na quimiotaxia, adesão ao endotélio, capacidades oxidativa e fagocítica, mesmo após missões de curta duração. Apesar de alguns efeitos do cenário aeroespacial em neutrófilos serem bem reconhecidos, a contribuição específica da microgravidade é pouco explorada e nenhum estudo molecular foi realizado. Além disso, a microgravidade também modifica a expressão de microRNAs (miRs), que regulam, concomitantemente, a diferenciação/manutenção do músculo esquelético e participam da sinalização inflamatória de citocinas. Nesse contexto, observa-se que as consequências da microgravidade afetam de forma interdependente tanto o sistema locomotor quanto o sistema imunitário. Além disso, um tema que vem ganhando relevância, é o uso da restrição de fluxo sanguíneo (RF) (por manguito de restrição) usado junto ao treinamento de força (TF). Essa associação remete a uma alternativa interessante, visto que as cargas mecânicas aplicadas nesse modelo (TF + RF) seriam menores do que a aplicação do TF convencional que, em condições catabólicas geradas pela microgravidade, favoreceria a recuperação desses tecidos. O grande desafio deste projeto será entender como as alterações causadas pela condição de microgravidade podem ser mitigadas pelo TF e RF quando do retorno à carga. No sentido de avaliar as alterações induzidas por um modelo de microgravidade, os danos causados pelo retorno e os mecanismos pelos quais TF e RF poderiam minimizar tais danos, propomos a combinação de abordagens moleculares, morfológicas e funcionais. Pretende-se um estudo detalhado e comparativo do comportamento de um conjunto amplo de biomoléculas, a análise multi-ômica, combinando proteômica, transcriptômica e metabolômica, além de outras análises moleculares, morfológicas e funcionais, capazes de identificar mecanismos responsáveis por respostas fisiológicas nesses três eixos biológicos (músculos, meniscos e neutrófilos). Esse entendimento fornecerá novos insights úteis para investigar melhores intervenções terapêuticas que previnam ou minimizem as alterações nesses sistemas fisiológicos durante e após o retorno das missões no espaço à Terra.
Palavras chave: Microgravidade, Aeroespacial, Resposta Inflamatória, Multi-ômica, Neutrófilos, Degeneração, Meniscos, Músculos, Treinamento de força, Restrição de fluxo sanguíneo